sábado, setembro 24, 2005

 


As Centáureas



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Sandro Botticelli - 'Nascita di Venere' (fragment)
Tempera on canvas, 1485, 172.5 x 278.5 cm
Galleria degli Uffizi, Firenze



Botticelli e as Centáureas




ao ranger da bruma
ergo o ferrolho à noite doirada
e plácidas são as estrelas desta hora
Movem-se degraus incertos
sombras no manto
quando me estendem o ouro batido
em folhas finas, o cerúleo
que o graal já desfez em poalha


é sob o fogo da vela
que vejo o contorno da veste
e a forma da flor segue o circulo da minha mão
As Centáureas: colhia-as? criei-as?
espelhos são daquelas que a Hora bordou
para acolher da espuma as formas do amor.



Ana


A partir da obra de Sandro Botticelli
"O Nascimento de Vénus", pormenor de "Hora"










as musas murmuram o beijo na carícia das folhas
tecendo acordes sob a pele dos ulmeiros
a palavra fascina, voa na ternura do vento de doce perfume

o amor floresce na proximidade da deusa
e por vezes o perfume flui no desejo
quando o suspiro procede do mel.

a deusa sussurra: "o desejo flui no suspiro"


Paulo

por Uther ás 20:12






domingo, setembro 11, 2005

 


Le Voyage Magnifique



Burne-Jones - 'The Three Graces' (fragment)
Charcoal and pastel on brown paper, c.1890 - 1896, 139 x 69.5 cm
Private collection






«Era um homem que esperava tudo, não esperava nada, atirado de vaga em vaga, perdido no espaço, no tempo, sem objectivo, como um pára-quedista aterrado no mundo por acaso, e que envidava todos os seus esforços para que essa opacidade que o envolvia e esse mistério de que ele era feito não se quedassem alheios um ao outro.

Sentia-se qual absurda peça de cartão ficada nas mãos do jogador, quando afinal o puzzle está formado, terminado: perfeito.

*



O deserto não é a ausência.
É o estado anterior à presença, antes de os nómadas o atravessarem, antes de os aventureiros lá se deterem para em seguida tornarem a partir noutra direcção. Ele é. Sem precisarmos de lhe delimitar contornos, uma geografia, uma superfície, ele é o deserto. Esse lugar onde nos perdemos, onde o mundo é aniquilado, onde o tempo é desprovido de velocidade, onde o dia e a noite se sucedem sendo um qualquer dia e uma qualquer noite, com o mineral presente, de formas efémeras, a poeira, a pedra, os rochedos, a areia... E a toda a volta, o espaço e o céu... Ele é o lugar de nenhures onde por vezes uma palavra pode apoderar-se do seu infinito.


*



De onde vem esta nostalgia que trazemos em nós e que nos dá por vezes o sentimento de termos perdido uma imensidade? Não uma saudade de paraíso desaparecido onde tudo teria sido belo, simples e duradouro. Antes um mal-estar, como em certos despertares, após uma noite em que o sonho nos deu o direito de voar acima das árvores e dos telhados dos prédios. Ter perdido um poder.

Os nossos olhares projectados na direcção do oceano ou das noites estreladas do Verão reconduzem-nos invariavelmente a esta perturbação que parece tão banal e partilhada que ninguém dela fala por receio do ridículo. Haverá um espaço perdido que é capaz de ressurgir a cada um dos nossos confrontos com as imensidades que estão ao alcance da mão, o céu, os oceanos, os desertos, a noite... Encerrará porventura o código genético, além dos testamentos do pai e da mãe, a marca de uma viagem sem moderação através de cada recanto daquilo a que se chama o Universo?...

Há nestes impulsos misteriosos para espaços infinitos e na ideia que deles fazemos, a marca de uma tentativa que se esforça por reencontrar uma imensidade de que a determinado momento tivemos conhecimento mas que desapareceu. Cada criança que vem ao mundo ver-se-á acaso privada de uma imensidade de que teria disposto, antes de nascer, muito antes de possuir cérebro e uma consciência, e com a qual brincava sem lugar, sem referência, aqui e em toda a parte, livre?

A vida seria então o fabrico de um invólucro que desprende do mundo uma parcela de infinito, para lhe outorgar um peso, um lugar, um início e um fim.»

Yves Simon: “O viajante magnífico”
(tradução: G. Cascais Franco)




«Le désert ce n´est pas l´absence.
C´est l´état d´avant la présence, avant que les nomades le traversent, avant que les aventuriers ne s´y arrêtent pour ensuite s´en aller et repartir ailleurs. Il est. Sans avoir à en délimiter les contours, une géographie, une superficie, il est le désert. Ce lieu où l`on se perd, où le monde est anéanti, où le temps est sans vitesse, où le jour et la nuit se succèdent en étant n`importe quel jour et n`importe quelle nuit, avec le minéral présent, aux formes éphémères, la poussière, la pierre, les rochers, le sable…Et tout autour, l`espace et le ciel… Il est le lieu de nulle part où parfois un mot peut s`emparer de son infini. »

Yves Simon: “Le Voyageur magnifique”




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Burne-Jones - 'The Three Graces'
Charcoal and pastel on brown paper, c.1890 - 1896, 139 x 69.5 cm
Private collection










Franz Schubert: Fantasie In F Minor For Piano Four Hands, D 940 (op. 103)

Maria João Pires & Ricardo Castro








por Uther ás 08:41






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